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segunda-feira, 17 de dezembro de 2007



A Clace Palled Home

Antes eram gritos, e ecoavam pelos corredores do auto-intitulado "lar". Agora já não se ouve quase nada se não prestar atenção. Procure nos cantos, é de lá que vêm os gemidos. O que mata as plantas é o sal das lágrimas. E estamos todos morrendo, como ela(s). As sombras não são nada além de espíritos divagando tão perdidos como qualquer um que eu possa ver. Mas não quero ver ninguém, não quero nada. Queria que tudo fosse embora.

Ela diz exatamente tudo que eu sinto. Mas ela não sabe, e está sentindo agora o que sempre viu em mim e ignorou, fingiu não ser nada. "Não é nada!". Assim, simples, cinicamente acreditando nela mesma. Tem o dobro da minha idade, talvez mais. Nossa diferença é que ela não viveu, enquanto eu luto para não sobreviver. E como pode se abrir tão facilmente daquela maneira? Quase sinto inveja se já não sentisse outras milhões de coisas por ela. Meu pecado é desejar que fosse muda toda vez que grita. Então choraria em cima dela. Queria que ela fosse embora.

Minhas dificuldades aumentaram porque tentam tampar minha visão. Meus olhos que nunca olham o que está, porque a cabeça quer que (a)voe, e o coração. Seu "lar" na verdade nunca existiu, e se existiu, nunca fiz parte dele. Como eu posso chorar por alguém que nunca amei? E ninguém ouve meus pedidos de socorro abafados pelos seus.







...socorro...



































...socorro...




























...Adeus.

A farsa lavada

A chuva que bateu na janela pela manhã despertou quem dormia ali perto, correndo o risco de se molhar. As densas gotas d’água caíam no rosto ainda dormente para alertar sobre o que viria em seguida, como se a água fosse capaz de prever mudanças e ainda descrevê-las com a finalidade de possibilitar maior precaução.

O rosto molhado e atônito dirigiu-se ao espelho do lavabo e constatou que a profecia da chuva já havia se iniciado: não se reconhecia. Não pela fisionomia que lhe parecia a mesma desde a época em que ainda não sabia andar ou mesmo se expressar sem ajuda, mas pelo que ele representava por trás daqueles traços palpáveis e disformes.

Não era o mesmo rosto, por mais que apresentasse alguma semelhança. As olheiras fundas de cansaço acumulado e a sobrancelha perfeitamente desenhada numa tentativa de compensação. Agora no espelho não via nenhuma razão para amenizar algo que a sua própria realidade escancarava em sua face. Dezenas de minutos se passaram enquanto os olhos se viam por meio de um reflexo querendo entender porque tantos outros minutos foram gastos na produção desta farsa.

A feição amena provinha do esforço ditado por um motivo já desaparecido e, com ele, até mesmo sua essência transposta por características mais aceitáveis havia sumido. O rosto não se via e nem reconhecia o que era visto, por pouco não se apresentava como um estranho que teve a ‘impressão de já conhecer o outro de algum lugar’.

Sua imagem já dizia nada a seu respeito e o que ela mostrava o fazia esquecer de quem realmente era; sua imagem o denegria da maneira mais sutil e, um tanto pior, com o seu consentimento. O desespero tomou conta do rosto anônimo e logo ele se pôs em baixo da corrente de água fria despejada pela torneira complacente. A água da chuva o havia alertado, por isso talvez esperasse algum milagre da água encanada, mas a imagem estranha continuava inerte, estampando seu conteúdo incógnito.

Aquela impureza provavelmente era demasiado concentrada para ser eliminada com tão pouco. Tentava, então, o sabonete, a esponja, o sabão em pó, o detergente e, em sua última tentativa, pensou em recorrer à cândida. Antes que a pusesse em sua pele, já sem qualquer esperança de obter um resultado positivo, lembrou que a limpeza de seus pertences domésticos e até mesmo da água que bebia poderia ser feita por efervescência.

Levou uma panela de água ao fogo e, quando as bolhas subiram declarando seu estado máximo de pureza, o rosto invejoso mergulhou-se nela até que ele não pudesse mais sentir o seu processo de re-estruturação por desintegração. Sem sentidos caiu no chão da cozinha e, até onde pôde, esboçou um sorriso. Agora não seria mais reconhecido pelo que não sabia o que era: em carne viva sentia-se mais próximo do que de fato era. Satisfeito, só esperava que ainda estivesse chovendo para ir, de corpo inteiro, agradecer.

domingo, 16 de dezembro de 2007

Ever After

Como dizia Vinicius de Morais, “que seja infinito enquanto dure”, e eu acredito que dessa maneira funcionam os relacionamentos e o amor. Tudo é eterno, até acabar. Momentos ficam marcados para sempre, nunca nos deixando esquecer que algo existiu. Latentes em tudo o que você representa, te construíram.

No entanto, os finais felizes nem sempre me deixam feliz. O sofrimento, a amargura, a morte, são mais marcantes. E, ao invés de um sorriso no rosto, deixam um aperto no coração. Te fazem remoer os fatos e cenas, até lacear um pouco o nó na garganta. Você continua não entendendo, e não querendo aceitar, mas ele estará lá enquanto o sorriso já tiver abandonado o rosto dos outros.

A cada fim do para sempre fico imaginando até quando tudo durou. E penso que não há final de contos mais inteligente do que os alemães: “und wenn sie nicht gestorben sind, dann leben sie noch heute”.

Uma bala pra você que compreendeu.

Pois, então, seria a solução começar, sabendo que, quando acabar, durou?

A falta de duração deixaria falhas na construção?

E se, chegada a hora do para sempre, nada funcionasse por não haver precedentes?

E se o filme da minha vida estivesse fadado a um final feliz? Seria assim tão ruim?

Preferível a sofrimento, amargura e mortes.

Ou, talvez, eu esteja só confusa. E a mistura de vida real e fictícia seja inevitável nesse momento.

Mas, e se?





*ta, eu não seria tão má: “e se eles não morreram, vivem até hoje”, e isso deveria bastar.