Foi em Paris que conheci uma das tantas pessoas incríveis que passaram pelo meu caminho. Já era tarde da noite, voltava da sessão de fotos no Moulin Rouge, quando resolvi passar num Minimarket. Eu estaria sozinha num quarto 2x2 em um dos bairros mais feios de Paris, nada mais oportuno para se fazer do que beber. Enquanto procurava algum tipo de álcool identificável em francês, um sujeito-do-tipo-mendigo se aproximou. “Por favorê, você tenhê cinquentê centavês?” (leia fazendo biquinho de francês). Eu respondi em alemão que não estava entendendo (e ainda fiquei morrendo de medo de estar sendo assaltada). Ele olhou, pensou e disse: “English?”. Yes, yes. Bom, o senhorzinho explicou que estava querendo cinqüenta centavos pra completar os três euros da garrafa de pinga e, tendo ele o mesmo objetivo que o meu, não pude negar ajuda. Minha grande surpresa veio no final. Eu decidi por uma Smirnoff, paguei e estava a caminho do Hotel quando o pseudo-mendigo me chamou e correu até mim. Fodeu, agora eu seria assaltada de verdade, ele me levaria muito mais que cinqüenta centavos. E o seguinte diálogo se passou:
- Oi garota, obrigado pelos centavos. Você é alemã?
- Não, não. Sou brasileira?! (medo.)
- Brasileira?!
- Sim, sim.
- Puxa, mas então quer dizer que além de alemão e inglês você fala também PORTUGUÊS?!
(Sabe aquela musiquinha de filme do tipo descobrimento do tesouro: ta rAaaAaamm?! Ouça-a.)
O mendigo-francês-sem-dinheiro-pra-pinga sabia que no Brasil se fala Português! Sabe quais as chances de alguém acertar esse enigma?! Nulas! Nem a loira da Lituânia que parecia uma pessoa inteligente sabia disso. Aliás, a criatura pensava que falássemos inglês: “Mas ué, na América não se fala Inglês?”. Ahan, e na África africano.
Durante a passagem por Atenas conheci outro senhor, são sempre eles! Entrei numa joalheria, e o vendedor todo simpático, como todos por ali, me comprimentou dizendo algo que distoava do sorriso dele. Você já ouviu algo em grego?! Palavrões. Ele entendeu minha cara de quem não sabe se recebeu um oi ou foi insultada, e disse: “English, français, Deutsch, italiano, português?”. Duvidei: “Do you speak Portuguese?”. E ouvi num português incontestavelmente nativo: “Mas é claro que falo, não acredita em mim garota?”. Tá, tá, acredito. Papeamos por um bom tempo. Ele era brasileiro, 60 anos, tinha sido um grande jurista no Brasil. Dava aulas na faculdade, e apaixonou-se pela professora de grego, uma “deusa-grega”. Casou, teve dois filhos. Moraram 20 anos juntos no Brasil, mas a esposa sentiu saudades de casa. Ele largou tudo, e mudou-se com a família para Atenas. Disse sentir-se triste, as saudades do Brasil são enormes, mas faria tudo de novo, por ela.
As pessoas mais especiais que conheci foram as do meu curso na Alemanha. Estrangeiros de toda parte do mundo, lutando para aprender uma língua difícil e viver num país estranho. A garota da Túnisia, 28 anos, sempre com All Star e um sorriso no rosto, nunca-a vi mais feliz do que no dia que mostrou seu álbum de casamento, duas vestes típicas e 5 dias de festança. O casal Polonês que tinha uma vida dura, sem casa, sem emprego, e um filhinho de cinco anos que aprendia alemão mais rápido do que qualquer um ali. A peruana, 20 anos, foi para a Alemanha ser Au-pair, se apaixounou pelo Host divorciado, eles se casaram e ela nunca mais voltou para casa. Minha grande amiga grega, que largou tudo em Atenas para vir morar com o namorado que não tinha certeza se amava. E minha professora, Dorothea, casada com um peruano, insistia em discutir o aquecimento global e suas conseqüências em nossos países, e vivia me perguntando “qual é aquela palavra bonita em brasileiro?”:
- Saudades, Dorothea, em português.
Saudades.
quinta-feira, 2 de agosto de 2007
Caminhos e pessoas
Postado por De Lancret às 22:26
Marcadores: Talita Galli
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8 comentários:
Ainda acho q o "Caminhos" principal ainda não foi postado!!!!
Aguardo anciosamente...!!
Ótimo texto!!!
Bjs!!
Regina
Adorei, Talita!
são experiências reais?
achei lindo... lindo!
Esperiências de vida.^^...
É assim que se faz.
A vida da gente é um misto de Lego, Imagem & Ação e álbum de figurinhas da Copa de 94.
Algumas peças a gente encaixa, outras a gente vai adquirindo com o tempo, mesmo as mais difíceis, como a figurinha do Bebeto, agora algumas, muitas vezes as mais importantes, só são agregadas através de um misto de tirar o cartão certo e entender a mensagem que nos passam.
O resto... o resto é tabuleiro de banco imobiliário.
retificando:
*experiências
Ah Tata eu já tinha dito que adorei o texto.
Adoro o modo como vc escreve, o humor nas palavras, tudo!
E o melhor é que nossos personagens nunca são alguém totalmente inventado né?
Beijo
“Mas ué, na América não se fala Inglês?”. Ahan, e na África africano.
AHAHAHAHAHAHAHAH
Sou seu fã! Já te disse que você tem um diferencial!!
Um texto que fala de linguas e culturas e pessoas e viagens!!
Tem como eu não gostar??
Só faltou falar de música...
...
...
Não faltou não!! hahaahahahaha
Bjs!
Toad
putz, adorei, tata.
assim como sempre adoro o que escreve!
mas esse, se me permite dizer, é o meu preferido.
dá vontade de pular e apertar. hahaha.
beijo.
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