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segunda-feira, 13 de agosto de 2007

Inside the cage

Sabe, desde que você foi, o que eu achava ser solidão necessária, perdeu o gosto bom. Pra que pensar se as pessoas só ouvem e não entendem nada. Você entrou naquele maldito avião e desde então tudo me irrita. A boa vontade das pessoas me irrita. Me irritava antes, tudo me irritava, mas dessa vez não tem você aqui para fingir que entende. E só você finge bem.

Continuo escrevendo e fingindo que é para nada. Talvez queira ser como eles. Nunca te falei, mas sinto falta da normalidade. Certas coisas só são legais em vidas alheias e essa é a minha.

Eu tô lendo um deles mas não quero as palavras dele. Quero as suas, nem que seja em uma noite bêbada, a ligação longe e ecoando. E você ali tentando me falar alguma coisa. Como naquele dia que você falou, falou, falou e eu não ouvi nada. Meu cérebro desligava quando encontrava o seu olhar. Podia ver minha alma dissolvida na sua vida. E tudo virava só um líquido como aqueles sucos em pó. Mas você não bebeu até o fim e o resto ficou concentrado no fundo do copo. Eu também fingia que entendia, ou talvez, lá no fundo eu entendesse mesmo.

Escrevo na minha agenda fofa pra te trazer para junto de mim nesse metrô. É aquela da qual você riu quando viu. Era inacreditável eu quebrar minha pose em uma coisa tão menininha enquanto eu tentava ser mulher. A sua mulher.

Talvez, você também pense algumas coisas parecidas enquanto está aí onde um dia pensamos que estaríamos juntos.

Acabei de encontrar uma moeda no banco ao meu lado. O cara levantou e eu fiquei com preguiça dele e da interação. A moeda continua no banco ao lado. Ele era legal. Se abaixou para pegar o meu relógio que se soltou do meu braço quando sentei. Lembrei daquelas moedas que nos procurávamos pela casa para completar o preço dos nossos vinhos vagabundos. Aqueles que nós molhávamos em salgadinho para ver o quanto nossos fígados nos odiava. O salgadinho azul e as nossas risadas. Bebíamos mais e mais. Eu peguei a moeda para guardar junto com essa lembrança. Mas agora eu tenho outras, trabalho para espantar as saudades e comprar alguma diversão na adega da esquina. Você não sabe, mas eu não bebo mais vinho. Ele tem o seu gosto e eu passei mal daquela vez. Quase tão mal quanto o que você me faz. Só que eu pus pra fora e você continua aqui dentro.

Cheguei na Saúde. Estranho pensar que a minha saúde é frágil graças aos excessos de besteiras e a secura de você.

Lembra de quando ríamos dos casais programados para dar certo? Acho que desde então, sabíamos que nós não daríamos.


Sabe qual é o seu problema? Você fica aí tentando me decifrar e pensando coisas feias. Enquanto, eu estou aqui pronta para responder as suas perguntas. Ou não. Mas, estou aqui, como sempre estive e você com essa sua maldita distância. Daí ninguém entende as coisas e todos ficam falando, falando, falando e eu cansei de ouvir. Todas aquelas vozes que não são a sua. Todas aquelas coisas que não são as suas. Toda aquela vida que não é a sua. Vou pegar um gato vagabundo e livre e afofar ele. Cuidar, alimentar e limpar. Como se fosse você. Na verdade ele é melhor do que você. Vai se apegar a minha casa e depois dar no pé com uma gata borralheira da mesma espécie. Então, eu aumento a família e a trago pra cá. Formaremos um triângulo amoroso muito mais interessante do que este.

Quando o telefone tocou ontem pensei que pudesse ser você. Corri para buscar o celular e a voz do outro lado parecia uma gravação. Tudo muito longe. Tudo muito perto. Você me pedindo coisas que eu não conseguia entender. Parecia bêbado, confuso e mentiroso. Como naquele dia no qual você falou que seria para sempre. O para sempre ainda não acabou. Minha imaginação queria acreditar que você não sairia daqui. E eu podia dormir e acordar olhando as suas costas. Sempre as suas costas. Mas você levantou aquele dia e falou que ia. Perguntei qual era o seu problema e voltei a dormir. Achei que era mais uma brincadeira. Achei até ver aquele avião partir e você ir sem mim.

Todas as noites penso em como tudo poderia ser diferente se eu não olhasse essa rotina nos olhos. Pouca coisa faz sentido. Alguns planos que me levam de volta aos seus braços. Você sempre sorria e nem era para mim. Era pra minhas mentiras e histórias surreais envoltas em uma névoa de fumaça. Sempre lembro de você quando vou naquele bar. Ele agora é enfrequentável. Seja pelas lembranças ou por não suportar aquelas pessoas. E ele ainda esquenta minhas mãos, mas não tem a sua jaqueta para eu transpor e formar um laço na sua cintura.

Quando eu acho que acabou. O filme recomeça e você impregna em um corpo consumido. Falo as coisas que seriam suas para qualquer um. Só porque consigo sentir o seu cheiro no corpo deles.

Ainda tenho os livros que você me deu enquanto falava que eu ainda tinha muito a aprender. As músicas que ouvimos juntos, naqueles cds que não lembro como você conseguia, aquelas mentiras que bebíamos em forma de vinho barato.

Vou ali gastar aquela moeda com um doce para tirar o seu gosto da minha boca enquanto não o tiro do coração.

Com amor,
sue.

4 comentários:

Ogami disse...

Sue, um texto Sue de ser.
Jeito Sue.
Estilo Sue.
..
..
"É mulér, a vida não é só a Bela Cintra..."
hauah.
Thumbs up.
Bjo grande.

p.s.: devo-te um delivery ao vivo

Milla disse...

Tudo tão melancólico...
Sai da gaiola Su

Certas coisas insistem em não sair do coração porque a única forma de jogar fora é pela boca mesmo.
Falando ou xingando mas palavras soltas em um blog não tem o mesmo efeito...

Beijo

ligiazm disse...

minha escritora sempre preferida do susi! *.*

caralho. você escreve as coisas certas! já disse que tu deve ler minha mente antes de fazer seus textos, né?! então, repito.
as lembranças são diferentes. o resto, tudo igual.

que texto FODA :')

Anônimo disse...

O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.

E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as dores que ele teve,
Mas só as que ele não têm.
(...)

Da onde vem tanta saudade? Da onde vem tantas lembranças? Fico imaginando se no dia que você passar por uma separação traumática como essa que você escreveu, se vai deixar o texto ainda mais triste (e ainda maior, já pensou?) ou se vai deixar o assunto de lado e desconversar.

Espero que eu nunca tenha que saber.

AMO.
=*